terça-feira, 2 de junho de 2009

Razões porque falamos diferente

Alguns fenômenos lingüísticos concorrem para a formação do dialeto. Alguns desses fenômenos já estão classificados e estudados pelos filólogos, outras ainda demandam estudos mais aprofundados para receberem nome e classificação.
Desses fenômenos os que mais contribuíram para esta obra são os metaplasmos. Metaplasmo é designação comum a todas as figuras que acrescentam, suprimem, trocam ou transpõem fonemas nas palavras. São também chamadas de metagrama.
Os metaplasmos são três: os que adicionam, os que suprimem e os que permutam. Cada um desses três consiste em mais três, sendo que alteram o início, o meio e o final dos vocábulos.
Vejamos o esquema abaixo

ADIÇÃO prótese Epêntese, paraptixe
anaptixe ou suarabácti Paragogia ou epítese
METAPLASMO TROCA assimilação Dissimilação ou metátase apofonia
SUPRESSÃO aférese Síncope apócope

Exemplos
ADIÇÃO prótese Epêntese, Paraptixe
Anaptixe ou suarabácti Paragogia ou epítese
Agaranto por garanto
Insaião por saião Tareco por treco
Mendingo p/ mendigo Soli, mari por sol, mar
Dogi, tregi p/ dois, três.
SUPRESSÃO
(Hiférese) aférese síncope apócope
Tadinho por coitadinho
Vô por avô Aguidar por Alguidar
Grado por graúdo Bobagi por Bobagem
Está por estar
TROCA Assimilação Dissimilação ou metátese apofonia
Gardecido por agradecido
Atricado por taricado Tauba por tábua
Parteleira p/ prateleira Degavá por devagá
(com apócope)

Baseado nos quadro acima, proponho ainda:

Duplo-metaplasmo
Epêntese/apócope Esmolecê por amolecer
Triplo-metaplasmo
Prótese-epêntese/sincope Adispôs por depois
Tetra-metaplasmo
Prótese-epêntese-epítese/síncope *Adispogi por depois

*Adispogi. Foi inserido por prótese, a vogal inicial/A/. Foi inserido por epêntese a consoante/S/(dis). O ditongo /OI/ foi reduzido para a vogal /O/, apenas, devido à apócope da vogal /I/, conservando o /S/:.(pôs). E acresceu por paragogia em virtude da pronúncia chiante da fricativa terminal /S/, a pronúncia palatal (ge) cambiando p/ /I/= (gi)


Ainda no assunto dos metaplasmos, a NASALIZAÇÃO de alguns vocábulos, criam alguns epênteses interessantes.
A nasalização pode ocorrer em situação pós-vocálica, com a inicial /I/, mesmo aquelas iniciadas em /E/ iodizadas, com a vogal /A/ e com a vogal /U/

Com a vogal /A/ sancristão.
Com a vogal /U/ gauncho, minúncia, desnuncar
Com a vogal /E/ (iodizada) Inducação, inleição, ingistir, inzemplo, inzibir
Com a vogal /I/ (inicial) Inguinorante, indentidade, ingual, indêntico;
Com a vogal /I/ (medial) mendingo, aimpim, cimintério, insonso. uninforme.
Com a vogal /O/ insonso



Possivelmente o outro fenômeno que mais contribui e é o PARAGRAMA, fenômeno que consiste no emprego de uma letra por outra.
Entre vogais o paragrama mais comum é o IOTACISMO que é a inserção da vogal /I/ (IODE) por outra qualquer. Também dita Iodacismo e iodismo e em outros idiomas é mais comum o ypsilonismo.
Por enquanto no vocalismo, o único paragrama que tem nome é o câmbio com a vogal /I/.
O câmbio mais comum é trocar a vogal /E/ por /I/. Isso ocorre tanto quanto na vogal quando é inicial, quanto nas mediais ou terminais.
Se tivesse que inventar nomes para esses fenômenos os batizaria de procliódicos, mesocliódicos, encliódicos, pois ocorre iotacismo no começo no meio e no fim.
Eis alguns exemplos:
Inicial: Inticar por enticar*; intertido por entertido, deformação de entretido; impolar, incantar etc
Medial Incandiar, ao invés de incandear, deformação de encandear. Cadiado por cadeado.
Final Mãi, leiti, píris, Isaqui; por mãe, leite, pires, Isaque.
*Enticar me parece síncope de entisicar.



O cambio do /I/ com outras vogais é mais raro, mas também ocorre. Veja no quadro dos câmbios vocálicos.
É comum haver iotacismo em alguns ditongos. Veja nesse quadro
Câmbio de ditongos /OU/ que evoluíram para /OI/
Toiça, loiça, loira, oiro, chovedoiro, casadoiro, toicinho, oivido e moirão, ao invés de touça, louça, loura, ouro, chovedouro, casadouro, toucinho, ouvido e mourão.
Isso é uma herança tipicamente portuguesa. Regionalismo português que fez esse ditongo evoluir. A prova incontestável é o nome do metal ouro, pronunciado oiro. Tanto que a região portuguesa, em virtude do nome do Rio do Ouro, elisada para Douro, ainda é grafada Doiro. A região Além-Doiro, ainda é muito usada.
Assim como ocorre iotacismo nos ditongos /EO/ = Pricupado por preocupado
Creolina por criolina etc.
Ainda, mais por influência dos idiomas estrangeiros que o nosso, o Ypsilonismo é mais comum.
Exemplo clássico no espanhol Calhe por Caje. (caye).
Por deficiência da pronúncia da consoante /L/ (lambdacismo) ou mesmo pela inexistência dela em alguns idiomas, a consoante /L/ além de evoluir para /R/ (rotacismo) como faz comunidade nipo-brasileira. Porém no Brasil é muito comum este fonema evoluir para a vogal /I/ (iotacismo).
No litoral catarinense, é mais raro, porém chega a ocorrer a evolução da alveolar /L/ para Iode.

Eles – passa a ser /eies/, com o segundo /E/ cambiando para a pronúncia de /I/ /eiis > eiij/
Elas – passa a ser /éias/, com suave apagamento da vogal /I/, passando à pronúncia /éas > éaj/


A humorista florianopolitana que assume a personagem Dona Maricotinha, que faz parceria com o Maneca e os dois formam a dupla “Os Manezinhos” em determinado momento do show, ela faz a seguinte bricadeira.
- Minha filha- diz ela – certo dia mi priguntô si eu sabia o que era “nudez” e eu arrispondi que sabia: Antes dez (deles) ponhá no da gente, a gente põe “nu dez”.(no deles)
Esse “nu dez” significa “no dez ou seja, “no deles”. “No dez” deveria ser representado “no deij”.

O caboclo brasileiro forma iotacismo, em especial com o dígrafo /LH/: fio, muié, cuié, por filho, mulher e colher.
O falante vulgar de centro do litoral catarinense, é um raro falante que conhece a consoante /L/.A maioria das línguas não conhece o /L/.
Por isso na questão das evoluções com o dígrafo /LH/ nosso falante comete apenas a apócope com a consoante /R/ final. Mulhé e escolhê, por mulher e escolher.
Grande parte da contribuição do nosso dialeto vem da linguagem autóctone. No entanto o índio brasileiro desconhece o /L/. Principalmente quando o tem som específico de /L/ . Considerando que esta consoante tem duas pronúncias. Veja a definição do dicionário Aurélio:
- É pronunciado, em início de sílaba, como consoante lateral alveolar (como em laranja e em falar).
- Em final de sílaba, pode receber essa pronúncia, ou a da semivogal / w/ (p. ex.: jornal; soldado).
- Seguido de /h/, forma dígrafo que representa a consoante lateral palatal (alho, lhama).]
Quando essa consoante tem seu som modificado para o som da semivogal /W/ que é esse som muito próximo da vogal /U/. Aí o autóctone não tem problema, ele a pronuncia.
”Principaumente, federau, estaduau, municipau é fáciu, porque o /L/ tem som de /U/ o pobrema era, pronúncia, quando a consoante era iniciau.”
Era comum o caipira com extrema incapacidade de articular esta consoante, pronunciar qualquer letra, para substituir o /L/. Como dissemos o japonês usa a consoante /R/, e o nosso caipira, além de substituí-la pelo /R/ usava a consoante /D/.
A coisa ficava mais complicada quando o /L/ é consoante inicial.
Era comum se ouvir: Daranja, digero, por laranja e ligeiro.
Em alguns vocábulos, parece-nos impossível substituí-la.
Para evitar a pronúncia, o FALANTE VULGAR (doravante denominado FV) busca substituir completamente a palavra por sinônimos, pois essas palavras lhe soa muito erudita aos seus ouvidos. Ele simplesmente estranha a pronúncia, achando-se incompetente para pronunciá-la: Exemplo: lábio por beiço assim como lágrima, se dizia “água do zóio”.
O caipira do interior brasileiro pode desconhecer o /L/ devido à miscigenação com negro e índio. Muitas nações africanas e na sua grandessíssima maioria, desconhece esta consoante.
Daí o mameluco e o cafuzo, desconhece o /L/, porque o índio e o negro, desconhece o /L/
Por isso eles pronunciam veio por velho, fio por filho, mio por milho, taio por talho.
Vejam essa rima, numa famosa canção popular.
Ca marvada pinga q’eu me atrapaio,
Eu entro na venda e já dô meu taio,
Me atraco no copo e dali num saio,
Ali memo eu bebo, ali memo eu caio;
Só pra carregá é que dá trabaio.

É a única forma viável para rimar atrapalho, talho com caio e saio.
Por isso o repentista está desaparecendo. Antigamente era mais fácil compor. A ditadura da gramática não permite tais colocações. Quando não havia tamanha fartura de verbetes, era mais fácil compor.
Muitas vezes, o FV simplesmente não pronuncia a vogal, como em avoroçado, ao invés de alvoroçado.
De qualquer forma detectamos ainda um fenômeno contrário a este que ainda demanda estudo. Vocábulos terminados com o ditongo /IA/ antecedido pela consoante /L/, o falante vulgar acrescenta a letra /H/ criando epêntese, só para não pronunciar a consoante /L/, mascarando a sua influência.
Familha, Brasilha, Odilha, Maurilha por família, Brasília, Odília, Marília; bem como o equivalente masculino: Odilho, Marcilho, Maurilho por Odílio, Marcílio, Maurílio.
Da mesma forma ocorre com o ditongo /IO/ Tulho, Julho, por Túlio, Júlio etc.
Na farta toponomástica catarinense, em sua maioria de origem guarani, não temos palavra com a consoante /L/
Nos que falamos português, temos a consoante /L/ por sorte. Nossa origem é Latim que começa com /L/.
A evolução da dígrafo /LH/ por /I/ pode ocorrer em palavras como CURUMIU, Iodização de curumilho. Depois por síncope reduziu-se para crumiu.
Em exemplo de forte evolução, mais adequado seria dizer involução aconteceu com o vocábulo senhora e senhor.
Senhora por um processo de síncope, com ocorrência entre falantes de média capacidade, reduziu-se para sinhá. Neste caso, com flagrante iotacismo na primeira sílaba. (senhá).
Por aférese perdeu a consoante inicial e ficou Inhá. Esta com forte aceitação ainda pelas classes eruditas. Na fase do escravagismo, por exemplo, quando mais se deu esse uso, os próprios senhores se referiam assim aos seus escravos. Eles mesmos repetiam a palavra aos seus escravos fazendo a institucionalização do uso. Uma dupla de cantores eruditos fez muito sucesso com a famoso música “Índia”, chamava-se “Cascatinha e Inhá Ana”
De inhá ainda por aférese reduziu-se pra nhá, devido à forma nasalizada em que se encontra. A forma redobrada, era bastante incomum, mas também era usada: nhanhá.
Na verdade mais usado, por incrível que pareça era a forma masculina: nhonhô. Haja vista a política patriarcal comum nos séculos passados, a forma nhonhô, por parecer mais respeitosa, era entendida como mais adequada para se usar como um pronome de tratamento aos senhores.
Na política patriarcal, em virtude do papel secundário da mulher, não carecia usar tratamentos tão formais à senhora da casa.
A forma nasalizada do dígrafo /NH/, sobretudo posposto à vogal /I/, devidamente ou coincidentemente antepostos às vogais /A/ e /O/, facilitam a evolução ou a pronúncia mais acentuada do IODE. Por isso as formas nhanhá e nhonhô, evoluíram para Iaiá e Ioiô. Quem não conheceu a personagem Iaiá Garcia de Machado de Assis?
O lingüista Osvaldo Antônio Furlan, certamente o maior estudioso da linguagem catarinense, lembra o fenômeno do apagamento dessa vogal em algumas situações. Na verdade isso é um belo exemplo de síncope: caxa, pexe, bejo por caixa, peixe, beijo.
Registra ainda o acréscimo (epêntese) dessa letra em situação interconsonantal. Pineu, adivogado, abisurdo por pneu, advogado, absurdo.
O professor Furlan faz lembrar também o apagamento (apócope) do /L/ final e o conseqüente acréscimo do /I/ em vocábulos terminados em /EL) móvi, nívi, horrívi; por móvel, nível, horrível.
Antes de existir como nação, Portugal falava o castelhano, por que pertencia ao reino de Castela. O então condado portucalense, dirigido por Dom Afonso Henriques, se rebelou contra a mãe, Dona Tereza de Borgonha, porque ele havia se juntado com o conde Galego.
Afonso lutou contra a mãe, separou o estado e adotou o galaico, que é um dialeto castelhano, como língua pátria, só para consagrar com mais convicção a independência.
Muito antes disso, sabemos da influência árabe na península ibérica, que enxertou a região com vocábulos árabes.
O árabe usa fartamente a consoante /L/. Alarife, alface, álcool, são exemplos de palavra de origem árabe.
Continuando com o estudo dos paragramas, verificamos o cambio entre outras vogais, que apesar de ser mais raro, existe.
Mais para frente estudaremos o fenômeno Lambdacismo, que é a dificuldade de se pronunciar a consoante /L/. Citamos os exemplos acima, porque evoluíram para as vogais /I/ e /U/
Adiante, analisaremos pronúncias envolvendo consoantes.


Câmbios vocálicos
È mais comum que se pensa, a troca de vogais dentro do vocábulo. Quem pensar que é absurdo usar uma vogal ao invés de outra, vai ver que não é uma coisa tão rara assim. É só prestar mais atenção.
É muito óbvio, que são pronúncias em estado avançado de vulgaridade, cujo processo está em franca extinção, já que a tendência é cada vez mais buscar a correção.
Do mesmo modo que as últimas reformas ortográficas, fazem-nos estranhar determinadas grafias.
Os câmbios aqui verificados, são confrontados com a grafia do Aurélio XXI
Câmbio com a vogal /A/
A troca da vogal /A/ por /E/

Amanhén por amanhã.
Atarentado por atarantado
Atezanar por atazanar.
Bergamote por bergamota.
Breganha por barganha com metátese.
Desdanhar por desdenhar
Enchova por anchova
Esmolecer, com epêntese de /s/ por amolecer
Gadelha por guedelha.
Lançol por lençol. (oeste do Paraná)
Lember por lamber.
Maniatar por manietar
Réiva por raiva
A troca /A/ por /I/
Inté, pela proposição e interjeição até, com a contribuição da consoante /N/ como epêntese, nasalizando a expressão.
Minhã por manhã
Aripuca por arapuca
Chaminé por chiminé.
Garipuvu por Garapuvu
Biacu por baiacu.
Biririsó por Baririsô.
Finiquito por fanequito
Minzuá por manzuá
Sinhaçu por sanhaçu
Indoçar por adoçar.
Troca de /A/ por /O/
(Além de servir para diferenciar o feminino do masculino)
Fosta por fasta – (aférese de afasta) na expressão imperativa do cavaleiro para dar ré ao cavalo.
Monotaço por manotaço
Rancolho por roncolho
Tomem por Tamém (variação de também)
Cacumbi por cocumbi.

Troca de /A/ por /U/
Munzuá por manzuá.
Mutungo por matungo
Cacumbi por cucumbi.
Câmbio com a vogal /E/
A troca /E/ por /A/
Sará por será.
Bobiça por bobice.
Balostra por balaústre
Espavitada por espevitada
Estrabuchar por estrebuchar
Baja por Vagem
Samear por semear.
Alefante por elefante.
A troca /E/ por /I/
É uso generalizado no país, tanto em situação de vogal inicial,medial e terminal. Inticar por enticar,
cadeado por cadiado,
mãi por mãe.
Desinteria por disenteria ou disinteria.
A troca /E/ por /O/
Alicerço por alicerce.
Belota por bolota
Berno por berne
Cerno por cerne
Estromecer por estremecer.
Bardo por balde (com rotacismo)
Lambico por lambique.
Profeitura por prefeitura.
Bardo por balde, com rotacismo.




Câmbio da vogal /I/
A Troca do /I/ por /A/
Baguaçu por Biguaçu
Rebolir por rebolar – inclusa no Dic Aurélio
Troca do /I/ por /E/
Biquine por biquíni
Deferente por diferente
Univale por Univali
Troca do /I/ por /U/
Existe um certo e longínquo parentesco entre essas duas vogais. Tanto que no alemão, a vogal com trema , vira som de /I/.
Talvez apor isso, alguns vocábulos até se confundem como em derrubar e derribar.
Subraju por subraji
Isca por usca – modo de açular cachorro.
Aribu por urubu
Câmbio com a vogal /O/
A troca /O/ por /A/
(além de fazer o diferencial entre masculino e feminino)
Onte-ontem(ti) por antes de anteontem.
Barboleta por Borboleta
A troca do /O/ por /E/
Esta troca por vezes é até permitida como no caso de percentagem por porcentagem
Provalecido por prevalecido.
Distercer por distorcer.
Eitão por oitão.
Percura por procura (com metátese)
Tope por topo (de montanha)
A troca do /O/ por /I/
Avaloar por avaliar. Como nesse exemplo.
“-Pra fazê minha pescaria/ eu tenho a minha canoa/ no dia q´o vô no mari/ não dô remadas à-toa.
Minha pesca é de espinheli/ tenho feito pesca boa/ tenho pegado peixe/ que ninguém não avaloa”. (Poema de Loca Cambriú)
Biloro por Boloro (paragogia de bolor)
Bituca por botuca – Mosca botuca.
Bimba por Bomba – regionalismo norte catarinense.
Licenço por Locenço.
Nódia por nódoa
A troca do /O/ por /U/
(Em situação terminal é uso comum em todo o Brasil)
Brigadu por brigado, aférese de obrigado.
Coitado por coitadu
Já em situação medial é raro, como neste exemplo: balaostra por balaústre.
Câmbio com a vogal /U/
A troca do / U / por / A /
Aribu por urubu.
Urupuca por arapuca
A troca do /U/ por /I/
Imbigo por umbigo.
Ticum por tucum.
Aribu por urubu.
Ajitório por Ajutório – síncope de adjutório.
Machiche por machuchu.
Poipar (apoipar) por poupar
Boiba por bouba
A troca do /U/ por /O/
Endoreceu, por endureceu.
Arronhar por arruinar.
Laoza por laúza
Amôo por amuo.

Desconheço qualquer cambio da vogal /O/ por /U/, quando o /O/ é inicial. Exceto se ela tem na sua etimologia, alguma letra antecedente. Excluindo-se a tal letra, por aférese o som passa a ser de /U/, como em ucê, deformação de ocê, aférese de você.
Em situação conhecida por sinalefa, fundindo-se a vogal /O/ com a letra anterior, em especial a consoante /S/, assumindo o som de /U/


O ouvido
Os ouvidos > Os uvido >
O /S/ final que faz o plural do artigo, se funde ao substantivo, modificando-o em número. O substantivo passa para o singular, resultando em /o zuvido/
Até aqui, câmbio do /O/ por /U/.

Outras situações comuns de sinalefa.
: Orelhas > /a zorelha / Olhos > Os zólhos > as zunhas

De entremeio o uso é restrito, a ocorrência em situação pós-bilabiais favorecem a evolução para o /U/ como em bucado, buliero, buceta, buneco.
No final é quase generalizado na linguagem coloquial do brasileiro: abusadu, morenu, caprichu.


Câmbios Consonantais
Se no vocalismo existe poucos nomes para denominar os fenômenos, no consonantismo quase todos os paragramas têm nomes. O ceceísmo (/C/) e o deltacismo (/D/ e /T/), são fenômenos mais fonéticos. Por causa da pronúncia defeituosa por serem homorgânicas, ou seja, cuja pronúncia depende do(s) mesmo(s) órgão(s).
A dislalia é um problema que promove esses fenômenos. Não encontramos, por enquanto, nenhum exemplo lexical convincente que se possa grafar.

C Ceceísmo Guspir por cuspir
D/T Deltacismo Guinâni por Dinâni.
F Fefeísmo Catrefa por catrepa
G Gamacismo Rezistro por registro
J Jotacismo Zezus por Jesus
L Lambdacismo Nelvo por nervo
R Rotacismo Borso por bolso
S Esseísmo Dimanchar por dismanchar
Z Zetacismo Espargir por espazir

• Este é um fenômeno especificamente ocorrido em situação de dislalia, não sendo considerado em escrita. Pronúncia de tátaros.

CECEÍSMO. Dificuldade em pronunciar a consoante /C/.
Balango por balanço.
Galota por calota
Bongá por congá
Calocha por galocha
Camboa por gamboa
Ginjo por chincho.
Gagarejar por cacarejar
Chacho por sacho
Chocha por socha
Ganzil por canzil
Tatumbi ou catumbi por cacumbi.
Existe ainda o ceceamento, ato de pronunciar as fricativas alveolares apoiando nos dentes a ponta da língua.
DELTACISMO. O deltacismo não me consta nem mesmo da linguagem vulgar corrente. Em regra provocado por fenômenos fisiológicos.
Geralmente são tão ordinariamente pronunciado por falantes de alto nível vulgar, geralmente com problemas gerais de pronúncia, comumente os tátaros (tatibitate).

FEFEÍSMO. Dificuldade de se pronunciar a consoante /F/. Sua troca por outra consoante é um fenômeno raro com poucos exemplos na linguagem catarinensista. O exemplo citado é um clássico. Catrepa, é consagradamente usada. Possivelmente uma variação de caterva que por sua vez evoluiu para catrefa.
GAMACISMO. Impossibilidade ou dificuldade de articular a consoante velar /G/ O exemplo clássico disseminado no litoral catarinense o Rezistro. Tanto faz aquele dispositivo para interromper o fluxo de água, (rezistro de água) quanto o documento do cartório.(rezistro de nascimento)

Às vezes é completamente ignorado pelo FV: barrudinho por barrigudinho

Bacarote por bagarote.
Furuncar por furungar
Bungá por congá
Concá por gongá ou congá.
Cambeta por gambeta
Camboa por gamboa
Gumitar (forma original) por vomitar (forma erudita)
Jajibo por Jajigo.
*Franzido por frangido. (adjetivo)
O vocábulo franzido pode cambiar com frangido. É comum o FV trocar um pelo outro, sempre. Quando é frangido ele fala franzido e quando é franzido fala frangido.

Algumas terminações com “canga” pode haver conversão para “cana” como em
Caiacanga para Caiacana
Guaricanga por Guaricana.
Guiana por Caiana

JOTACISMO. Dificuldade na pronúncia da consoante /J/.
Zesus por Jesus
Zuzé por Jusé > José.
Ajulejo por azulejo

LAMBDACISMO. Dificuldade de pronunciar a consoante /L/. Vem de lâmbda, nome grego da letra equivalente à consoante /L/. Lambdacismo deve ser o fenômeno mais comum, quando se trata de paragrama.
Devarde por debalde.
Socoi por sócoli – este é como resultado da comistão ítalo-brasileira. Recebemos sócoli (tamanco), que o caboclo abrasileirou para SOCÓI. A síncope do /L/ reduziu o termo que foi facilmente iotacionado uma vez que a consoante /L/ favorece a iodização.
Termo bastante conhecido por toda a colônia ítalo-brasileira de Santa Catarina, uma vez que o tamanco é uma peça imprescindível no vestuário do homem.
Como este vocábulo contém a duas consoantes que se permutam entre si, é só trocar uma pela outra, conforme a vontade do falante.
Pode ser simplesmente ignorado como em caboco, avoroço etc
Outro exemplo de variação por lambdacismo é o vocábulo AGUIDAL.
De origem árabe, alguedar, que é um prato ou tigela de barro variou ainda em arguidá, aguidáli, e suas correspondentes aféreses guidá, guidáli etc.

PEPEÍSMO. Criei este nome para o fenômeno que trata das dificuldades de pronunciar a letra /P/ como em conta-pé ao invés de ponta-pé.

ROTACISMO. Refere-se à pronúncia viciosa da consoante /R/ e a sua equivalente troca por outra consoante.

Ao que consta nenhuma língua tem dificuldade de pronunciar o /R/. Há idiomas, considerados trepidantes de tanto que usam esta consoante. É o caso da língua eslava, ou melhor, das línguas eslavas, pois a língua eslava se reparte em diversas sub-línguas.
Eslavo, vem do latim medieval “sclavo” que quer dizer escravo. No inglês Slave é um exemplo ainda melhor. Isso sugere uma linguagem originada por gente considerada inferior. Falantes ainda mais vulgares, do que os falantes usuais nas línguas consideradas principais. Se eram vulgares no princípio da linguagem, usada por gente inferior e se usam com facilidade a consoante /R/, é um prova de que a pronuncia desta vogal é de fácil assimilação.
O Eslavo é um grupo lingüístico da família indo-européia (Europa central e oriental), que se divide em três grandes subgrupos: eslavo ocidental (poloneses e checos e eslovacos), eslavo meridional (búlgaros, servo-croatas e eslovenos) e eslavo oriental (russos e ucranianos).
O eslavônio, usa por demais o som equivalente à nossa consoante /R/.


Mas porque então alguns falantes têm dificuldades em pronunciar este fonema? E o que é pior: trocam pela consoante /L/.
Mas como isso se explica, se há línguas que não pronunciam o fonema? Vamos explicar.
Certa vez estava numa oficina mecânica e o mecânico falou assim:
“Não consigo apeltar essa polca, tô ficando nelvoso com esta melda”.
Por quê então convertem o /R/ para /L/? Como pode então ocorrer essa troca?.
Citamos os exemplos de plumo e flauda ao invés de prumo e fraudas.
Neste caso o FV usa o recurso da segunda pronuncia do /L/. Ele deixa de usar a pronúncia formal alveolarizada, para pronúncia, velar palatal da vogal /U/.
Vejamos que o lambdacismo nestes casos, é vocalizado, ocorrendo com fonética do ditongo /W/. Ele pronuncia então:
“ não consigo apeutar essa póuca, tô ficando neuvoso com esta méuda.”
Credita-se esse fenômeno, a um outro chamado “ultracorreção”. O FV faz conotações de erros por rotacismo, como em: borso, carça, sór ao invés de bolso, calça e soli, paragogia de sol.
Em virtude desses rotacismos exagerados, ele tenta “corrigir” (ultracorreção) pronunciando a consoante /L/ em lugar desse /R/, porém mascarando o lambdacismo com a pronuncia da vogal /U/, como ocorreu nos exemplos supra citados: cóuda, póuca, neuvo.
O falante erudito também, na hora de escrever a palavra, “corrigiu”.
Quem criou os vocábulos foram os falantes comuns. Os gramáticos mais tarde corrigiram. E assim é com “barda”, que os nossos escritores corrigiram na grafia “balda”. Assim é com “fraquejar” e seu deverbal “fraquejo” que grafam falquejar e falquejo, pírula ou piula por pílula.

Disfalçar por disfarçar e seu respectivo deverbal, disfalce, por disfarce, são exemplos de dificuldades da pronúncia do /R/.
Alguns diminutivos o FV tem dificuldade de articular: colherinha ele pronuncia colhézinha.
Devagazinho por devagarinho.
Muitas vezes, simplesmente ignora essa letra: Bebigão por berbigão.

ESSEÍSMO. Proponho o batismo com esse nome à extrema dificuldade do catarinense em pronunciar a consoante /S/, não só em situação terminal, mas principalmente em situação medial.
O /S/ final é constantemente apagado no final de palavras no plural etc. Segundo Furlan, um brasileirismo, já que o lusitano se esbalda em usar o /S/ final. Ex. “Os menino e as menina”; quando os patrícios usam e abusam de “os gajos”.

Estranhamos o fato da síncope formada em situação muito semelhante uma das outras. Veja nos exemplos abaixo.
Dicascar por descascar
Dimanchar por desmanchar
Dicentrar por descentrar
Dicentralizar por descentralizar, todas pronunciadas com apócope do /R/ final.
Desejo por dejejo.

ZETACISMO. Dificuldade na pronúncia da consoante /Z/ - Incluindo palavras escritas com a consoante /X/ ou /S/, mas com som da consoante /Z/
Ajulejo por azulejo
Existir (ezi) por ingistir
Quagi por quase.
Existo – ingisto
Existe – ingiste.
Exigir (ezi) – Ingigir.
Desejo por dejejo.
Frangido por franzido
Jurrilho por zurrilho.


O fenômeno da PARANOMÁSIA OU ANTANÁCLASE é comum no FV vaidoso, consciente e inconseqüente. Ele tem rara consciência de seu falar torpe, no sentido gramatical, quer corrigir, no entanto, o faz de forma inconseqüente, empírica e sem fundamento, o que pode levá-lo a criar outro fenômeno conhecido como hipercorreção, que veremos a seguir.
A antanáclase é uma forma meio apapagaiada do FV citar uma palavra de pronúncia difícil e desconhecido, substituí-la por uma comum mais conhecida.
O exemplo mais clássico seria o adjetivo PRÉVIO. Prévio é uma palavra incomum, mesmo na linguagem culta. Geralmente substituída por palavras ou até mesmo locuções mais comuns tipo como: “antecedência”, “em tempo” etc.
Porém esta palavra mais cedo ou mais tarde vai fazer parte da vida da maioria da pessoas. Seria difícil encontrar um cidadão brasileiro, que nunca trabalhou, que nunca teve sua carteira de trabalho. Mais cedo ou mais tarde a grande massa empregada que é a imensa maioria dos brasileiros, vai se deparar com uma situação trabalhista denominada “aviso prévio” .
Como prévio não é uma palavra comum e, no caso desse dispositivo trabalhista, vem acompanhada do substantivo aviso e ainda como isso tudo significa uma situação pouco duradoura, coisa de um mês, o FV julga ou faz alusão a um período breve. Até porque o substantivo aviso, sugere uma coisa breve, urgente até, ou uma situação passageira, de pouca demora e daí o FV é induzido a pronunciar “aviso breve”.
Um outro exemplo seria o substantivo prorrogação. O conceito dessa palavra é ato ou efeito de prorrogar, dilação ou adiamento de prazo ou de tempo. Por isso o FV é induzido a pronunciar prolongação. Em época de copa do mundo, é quando a maioria do povo brasileiro se defronta com essa expressão, logo nas oitavas de final. A grande maioria dos falantes ouve a palavra corretamente dos locutores, no entanto a repetem ultracorrigidas. Isso porque a prorrogação dá mesmo idéia de uma prolongação ou prolongamento na partida. Apear de ser uma palavra em pleno desuso, de fato vai ser mesmo prolongada.

A HIPERCORREÇÃO ou ULTRACORREÇÃO ou ainda HIPERURBANISMO é outra forma sofisticada, porém não menos inconseqüente, do falante vulgar de média capacidade, querer corrigir à sua maneira, palavra que julga errada.
Quites é um exemplo. Esta palavra não varia em número, apesar de que na expressão “estamos quite”, a pessoa do verbo está no plural. Com isso o falante vulgar tende a flexioná-la para que concorde. Como na maioria das situações parecidas o adjetivo deveria concordar, o falante julga, desse modo, estar “acertando” na concordância. Porém costuma errar na maioria das vezes, dependendo do seu grau de ignorância. Por isso ele pode achar que seja 01 (um) lápi, porque lápis, sugere vários; do mesmo modo 01(um) pir, porque pires dá idéia de muitos.
Pode-se citar ainda outros exemplos de ultracorreção. O falante vulgar consciente, porém desinformado ele observa erros crassos no falante com grau de ignorância maior (alto nível de ignorância - ANI) que o dele.
O falante vulgar de média capacidade (médio nível de ignorância - MNI) pode reparar que, falantes abaixo da linha dele, com alto grau de ignorância, comete determinadas deturpações. São deturpações tão graves, que o MNI chega a reparar.
O MNI observa que o ANI fala sor, borso, carça por sol, bolso e calça.
Com isso ele tende a “consertar” certos termos parecido, que por alusão, julga errado. Por isso ele pode ser induzido a falar nelvo, colda, polca por nervo, corda e porca, porque relaciona essas com aquelas de cima.
Também acha que deve evitar supostas paragogias, como em Joinville, por exemplo. Este tipo de falante julga ser Joinvillí uma paragogia de Joinvil, por isso ele pronuncia o nome dessa cidade Joinvil.
Pela mesma referência ou alusão, o MNI, ultracorrige outras semelhanças. Ele vê o falante inferior a ele falar muié, ao invés de mulé, ou pela forma melhorada mulhé (de mulher); cuié por culhé (de colher).
Esses lambdacismos lhes soam errados por demais flagrante. É essa alusão que o faz resolver “consertar” termos semelhantes. Ele pode saber que o certo é tulha ao invés de tuia.
Por conseqüência pode ultracorrigir tocaiar ou sua equivalente prótese atocaiar, por atocalhar, que vem de tocaia.
Expressão como “porvir” é comum se ouvir “provir”. Não é uma simples metátese. É uma ultracorreção. Porque “pró” dá idéia de algo mais à frente, mais adiante. Ele acha que provir é uma coisa que vai vir mais adiante, mais à frente.
Um outro exemplo bem característico é trocar mata ciliar por mata auxiliar. O FV faz a conotação com este verbo, ao invés de cílio, que é o certo.
Também é comum o FV dizer “assustar o cheque” por sustar cheque. Talvez porque uma contra-ordem assusta quem saca o cheque.
O FV pode dizer que o juiz concedeu uma “eliminar” ao invés de liminar, geralmente quando tem sentido de execução. A ação executa algo. O Falante imagina que com a situação ou o problema está eliminado.
BLESIDADE consta nos dicionários de lingüística como vício de pronúncia que consiste em substituir uma consoante forte por outra fraca. Defeito que consiste em trocar uma vogal surda por uma homorgânica sonora: exemplo SS por Z. A troca da consoante /T/ por /D/, Zélio Jota também denomina de blesidade.

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